Um relatório alarmante divulgado pela Agência de Investigação Ambiental (EIA, em inglês) mostra que a produção e o uso do clorofluorcarbono (CFC) R-11, gás banido pelo Protocolo de Montreal, ainda são uma prática comum na China.
O documento, intitulado Blowing It, traz fortes evidências de que o uso de CFC-11 para expandir espumas de poliuretano é a causa do aumento de sua concentração na atmosfera.
Em maio deste ano, a Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos EUA (NOAA) havia revelado que as emissões de CFC-11 aumentaram 25% de 2014 a 2016 – uma média 13 mil toneladas por ano desde 2013.
Agora, a EIA coletou evidências em 18 empresas diferentes em 10 províncias chinesas, confirmando o uso do CFC-11 como agente de expansão na fabricação das espumas isolantes.
Até três décadas atrás, o CFC-11 era comumente utilizado como fluido refrigerante e agente expansor de espuma. Sob o Protocolo de Montreal, os países concordaram em eliminar sua produção até 2010, mas, desde 2006, os signatários do acordo vinham relatando uma produção quase nula.
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Além de ser nocivo à camada de ozônio, o CFC-11 tem um potencial de aquecimento global (GWP) 4.750 vezes maior que o do dióxido de carbono.
“Se a China não interromper essa produção ilegal, colocará em risco a nossa camada de ozônio, que está em processo lento de recuperação”, alertou Alexander von Bismarck, diretor executivo da EIA nos EUA.
“O CFC-11 tem um GWP muito elevado, o que o torna uma séria ameaça para o nosso clima também. E o que descobrimos é um problema sistêmico, e não apenas incidentes isolados. Isso requer uma investigação abrangente, conduzida pela nossa inteligência em todo o país, e penalidades mais rigorosas em todo o setor”, disse.
Crime ambiental grave
Vendedores e compradores de CFC-11 chineses disseram que o composto é usado em grande parte do setor de espuma de poliuretano no país.
Quase todas as empresas investigadas pela EIA indicaram que o CFC-11 compõe uma grande parcela ou toda a produção. Várias empresas sabem que seu uso é ilegal, mas alegaram que o gás é mais barato e capaz de produzir espumas mais eficazes.
As espumas de poliuretano são amplamente utilizadas no isolamento térmico de edifícios, assim como em eletrodomésticos, incluindo refrigeradores e freezers, tanto residenciais quanto comerciais. Sua fabricação envolve tipicamente a mistura de dois componentes. O primeiro, conhecido como “agente preto”, contém um composto orgânico chamado isocianato. O outro componente, “agente branco”, contém o álcool poliol misturado com outros ingredientes químicos e inclui um agente de expansão, como o CFC-11.
Um vendedor chinês do gás ilegal afirmou que, se o CFC-11 for misturado ao agente branco, ele pode ser exportado sem licença e não é reconhecido em testes.
Vários representantes de fábricas reconheceram a ilegalidade de suas ações. Segundo o relatório da organização não governamental, uma das fábricas confirmou manter um estoque da alternativa legal, o hidroclorofluorcarbono (HCFC) R-141b, “apenas para manter as aparências” durante as inspeções oficiais.
Os donos de fábricas hesitaram em divulgar a localização exata da produção ilegal de CFC-11, mas um deles citou “táticas de guerrilha” empregadas por alguns produtores, que mudam o local com frequência, a fim de evitar inspeções do governo.
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Um representante de outra empresa estimou que 99% de seus produtos usavam o CFC-11, produzido por fábricas sem certificação e com operações ilícitas localizadas na região da Mongólia Interior. O indivíduo estimou que o total de HCFC-141b no mercado é de apenas um décimo do CFC-11, e que apenas grandes empresas, como a Haier, usam o HCFC-141b.
Outro representante, que admitiu que toda a sua produção de agente branco usava o CFC-11, disse que a produção de HCFC-141b não é tão eficiente quanto a de CFC-11, e que a cada tonelada o custo é US$ 150 dólares a mais. O representante também afirmou que o CFC-11 contendo o agente branco poderia ser exportado sob o rótulo de 141b.
A investigação também identificou corrupção entre as autoridades. Um entrevistado relatou que sua empresa recebe inspeções, mas disse saber quando vão ocorrer através de conexões dentro da agência local de meio ambiente.
“Quando a agência ambiental municipal faz uma averiguação, nossos aliados internos ligam para mim e falam para fechar a fábrica. Nossos trabalhadores apenas se reúnem e todos se escondem. Não faz sentido, o governo está indo longe demais nesses esforços de proteção ambiental”, disse.
No caso de produção, venda ou consumo irregulares, a EIA diz que os envolvidos apenas sofrem confisco e recebem multas que variam de US$ 750 a US$ 150 mil.
“Este é um crime ambiental em grande escala. É necessário tomar medidas para garantir a fiscalização e o cumprimento de todas as obrigações do Protocolo de Montreal, incluindo as novas sanções sobre os hidrofluorcarbonos (HFCs). A maneira com a qual essa questão será lidada determinará se este tratado ambiental é realmente o mais eficaz de todos”, avaliou Clare Perry, diretora de campanha climática da EIA no Reino Unido.