Se você remexer na memória e consultar os colegas no mesmo sentido, provavelmente virá à tona a recusa de pelo menos um serviço por receio de que ele pudesse se tornar o último da carreira, frente à desafiadora localização dos equipamentos a serem instalados, reparados ou removidos.
Talvez se recorde também de algum caso do gênero no qual um ‘sim’ dado ao cliente, seja para provar coragem e capacidade técnica, seja simplesmente para não perder o trabalho, já que não está fácil para ninguém, tenha terminado em algum hospital, quando não em lugar mais drástico ainda.
Ocorre, porém, que um seleto grupo de técnicos resolveu transformar esse tipo de barreira física ao exercício de seu trabalho em novas oportunidades, a exemplo do ocorrido antes em outros segmentos, que também adotaram o chamado alpinismo industrial para ampliar seus horizontes de atuação.
Claro, nem todo mundo nasceu com vocação para Homem Aranha ou Mulher Maravilha, mas quando existe uma tendência natural de se chegar onde nem todos conseguem, que mal tem em se unir o útil ao agradável?
Deve ter sido exatamente este o pensamento de Paulo Daniel Rodrigues da Silva, fundador há 12 anos da gaúcha Padarosi, e que desde os nove de idade faz montanhismo, experiência também colocada por ele a serviço do HVAC-R, a partir de 2014.
Bem antes disso, ainda adolescente, ele aprendeu também a fazer rapel e, a partir dos 25 anos de idade, percebeu na cidade catarinense de Itapema as primeiras chances de tornar-se parceiro de profissionais dedicados a pintura e manutenção, antes de finalmente incluir o frio no portfólio de sua empresa.
Ao longo de toda essa escalada, no sentido literal do termo, Paulo reconhece vir se aprofundando em conhecimentos teóricos e práticos sobre a técnica de acesso por cordas e deslocamento vertical. “Os ambientes mudam constantemente e isso faz com que nos aprimoremos a cada instante”, justifica.
Quem assina embaixo ao tocar neste assunto é Luís Severo, que também se estabeleceu no Rio Grande do Sul, estendendo depois o atendimento ao mercado paulista, em parceria com a Bless Climatização.
Alicerçado numa vivência iniciada em 2015, fazendo rapel esportivo na Serra Gaúcha, ele atua no HVAC-R há 11 anos, dedicação conciliada ao trabalho de eletricista na construção civil e, mais recentemente, à promissora energia solar.
Qualquer que seja o segmento no qual alguém chegar ao locais mais altos e complexos possa fazer a diferença, Severo conta com o providencial auxílio da esposa Gisieli, uma socorrista ao lado de quem já ministrou palestras em grandes empresas da região sobre o assunto.
“Certas qualificações, como a realizada em NR 35, curso básico que deve ser seguido pelos N1, N2 e N3, elevam o nível de conhecimento para a prática do alpinismo, e nossa empresa tem por regra examinar esse quesito ao contratar sua equipe, além da cobertura por seguro de vida, uma precaução importante para contratantes e contratados”, explica o diretor da Severo Climatização.
Já no relato de Jardel Alexandre Fleck, proprietário da Clima Sinos, de São Leopoldo (RS), o impulso para também se tornar um refrigerista radical, no bom sentido, surgiu quando ele servia ao exército, na última virada de século.
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Hoje, com a experiência acumulada nessa combinação de talentos, ele concorda com os colegas que seguiram caminho semelhante, no tocante à importância de uma documentação tão completa e regular quanto a qualidade dos cursos a serem realizados por quem pretenda fazer o mesmo.
Mas, como em tudo na vida, não existem apenas flores para quem resolva ganhar o pão pendurado em cordas e coberto por EPIs específicos – aliás, outro ponto de honra para quem pretenda se dar bem no alpinismo industrial -, ainda se depara com muitos desafios.
“Nosso grande obstáculo sempre foram e continuam sendo os condomínios, que exigem esse serviço, mas não oferecem os meios adequados para a sua execução, a partir da ausência de pontos de ancoragem para os nossos equipamentos”, exemplifica Luís Severo, lembrando que tal situação frequentemente requer a intervenção do pessoal da engenharia civil para deixar o local apto e com menos riscos para ele e seus colegas de ofício.
Sem dúvida, tanto esforço físico e mental – aliado às habilidades que costumeiramente se espera de um técnico qualificado – precisa valer a pena, pois por mais que os especialistas em alpinismo industrial amem o esporte que mesclam ao trabalho, ninguém vive de brisa, seja no chão ou lá em cima.
“Nossa porcentagem de ganho, em comparação a uma instalação comum, em certos casos pode ultrapassar os 200%”, intervém novamente Jardel. Mas, na opinião desse técnico e mecânico de refrigeração formado pelo Senai, cuja empresa atende hoje os mercados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, ainda se paga um preço muito nesta área, em virtude de autoconfiança e até mesmo negligência, em alguns momentos.
Segundo o titular da Clima Sinos, 95% dos acidentes registrados no exercício da atividade decorrem de erro humano, algo que ele considera fundamental ser levado em conta por todas as empresas e profissionais intencionados em fazer do alpinismo industrial um dos seus principais diferenciais competitivos.