Um relatório divulgado às vésperas do Dia Mundial da Refrigeração, efeméride a ser celebrada amanhã (26), revela que aparelhos de ar condicionado obsoletos e ineficientes – muitos deles contendo o hidroclorofluorcarbono (HCFC) R-22, fluido refrigerante que destrói a camada de ozônio – continuam sendo despejados no mercado africano.
Essa prática comercial, conhecida como dumping ambiental ou ecológico, ocorre quando fabricantes globais montam operações em países onde as leis de defesa do meio ambiente não são rigorosas, o que contribui para baratear o custo final de seus produtos.
Atualmente, 35% dos sistemas de conforto térmico vendidos na África não cumprem os padrões mínimos de eficiência energética estabelecidos nos países de origem dessas multinacionais e quase metade ainda contém gás clorado.
É o que aponta o relatório publicado pelo Programa Colaborativo de Rotulagem e Padronização de Eletrodomésticos (CLASP, na sigla em inglês), uma organização internacional sem fins lucrativos que promove padrões de eficiência energética mais elevados, e pelo Instituto de Governança e Desenvolvimento Sustentável (IGSD), um grupo de reflexão ambiental sediado em Washington (EUA).
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O documento, intitulado Environmentally Harmful Dumping of Inefficient and Obsolete Air Conditioners in Africa, analisa a extensão desse problema em dez países – Argélia, Egito, Marrocos, Tunísia, Gana, Nigéria, Etiópia, Quênia, Tanzânia e África do Sul. Esse grupo é responsável por 96 % do mercado de refrigeração e ar condicionado do continente.
Os dados mostram que 650 mil aparelhos com taxas de eficiência energética (EER) abaixo de 3,0 W/W (COP de 3) estão sendo importados anualmente, embora os países fabricantes – incluindo China, Japão, Coreia do Sul e EUA – mantenham os padrões de eficiência bem acima de 3,0 W/W.
Além disso, 47% dos 800 mil sistemas de ar condicionado vendidos nos 10 países africanos avaliados ainda usam o R-22. A maior parte dos equipamentos restantes utiliza o hidrofluorcarbono (HFC) R-410A, e uma porcentagem muito pequena de aparelhos vendidos exclusivamente na África do Sul utiliza o HFC R-32. Por não destruírem a camada de ozônio, os HFCs são considerados mais ecológicos que os HCFCs.
Sugadores de energia
“Com a demanda energética crescendo em todo o continente, abordar questões de dumping ambiental não apenas ajudaria os países africanos a alcançar progresso em seus compromissos climáticos, mas também ajudaria a garantir que os consumidores locais obtenham acesso a aparelhos econômicos e de alta qualidade”, disse Rebecca Schloemann, a principal autora do CLASP.
Tad Ferris, consultor sênior do IGSD e um dos principais autores do artigo, descreveu os ares-condicionados ineficientes como “vampiros energéticos”. Como tal, ainda “sugam” a energia vital necessária para ajudar a recuperar a economia da desaceleração causada pela pandemia de covid-19.
“Parar o dumping ambiental e fazer o mercado priorizar sistemas eficientes e com gases de baixo impacto climático é essencial em um mundo cada vez mais quente, onde o calor e a umidade extremos podem, em breve, exceder os níveis adequados para a sobrevivência humana”, alertou.
Um quarto dos aparelhos de baixa eficiência contendo refrigerantes obsoletos foi importado de empresas não africanas. Os três quartos restantes dos eletrodomésticos foram montados na África por subsidiárias locais de empresas não africanas, sociedades (joint ventures) entre pequenas montadoras locais e grandes multinacionais ou fabricantes africanos independentes.
Uma grande parte (82%) das unidades com R-22 são montadas localmente – metade delas provém de joint ventures entre montadoras locais do Egito ou da Nigéria e companhias asiáticas. A China é a maior fonte de produtos importados com R-22 (57%), seguida pelo Egito (11%), EUA (3%), Nigéria (1,6%) e Coreia do Sul (0,6%).
O relatório sustenta que os equipamentos de baixa eficiência exercem pressão extra sobre os orçamentos dos governos e dos consumidores. Os clientes pagam contas de luz mais altas e os países pagam mais pelas instalações de geração de energia, importação de combustível e infraestrutura de transmissão e distribuição de eletricidade.
Adicionalmente, o dumping ambiental de produtos de ar condicionado com refrigerantes obsoletos pressiona a demanda futura por esses compostos nocivos ao meio ambiente, momento em que eles ficarão mais caros ou indisponíveis no mercado, criando incentivos para a falsificação e o contrabando de produtos químicos.
O relatório pede aos formuladores de políticas que interrompam o dumping ambiental e incentivem a transição tecnológica para sistemas de climatização e refrigeração mais eficientes e com fluidos refrigerantes de baixo potencial de aquecimento global (GWP), adotando várias políticas recomendadas, incluindo a ratificação da Emenda Kigali ao Protocolo de Montreal.
O documento também sugere a implementação de políticas de eficiência energética consistentes com os principais países exportadores, uma revisão das tarifas alfandegárias para garantir a compatibilidade com as metas de eficiência energética e a proibição da importação de equipamentos de segunda mão, reformados e ineficientes.
Para apresentar as conclusões do relatório, o CLASP e o IGSD vão promover um seminário on-line em 1º de julho, às 10h (GMT -04:00). O formulário de pré-inscrição para participar do evento está disponível neste link.
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