Nem sempre termina bem a história de mulheres agredidas, das mais diversas formas nas empresas, de onde muitas vezes saem traumatizas, com baixa autoestima e até mesmo a ponto de desistir precocemente de uma carreira com grandes chances de sucesso.
Exceções, porém, existem e uma delas conversou conosco para falar da evolução de sua trajetória, iniciada em 1998 como menor aprendiz numa grande fabricante de ar-condicionado, onde quatro anos depois ela ingressaria de corpo e alma em sua paixão até hoje, a área comercial.
Mas nada foi fácil para Débora Frias, que logo de cara enfrentou um chefe classificado por ela como altamente machista, que acabaria forçando seu pedido de demissão na multinacional que a recontratou algum tempo depois.
O problema foi ter de começar tudo de novo, tanto em termos salariais quanto nas atribuições sob sua responsabilidade, sempre dentro de casa, antes que voltasse a campo, onde sempre preferiu colocar em prática sua habilidade natural de transformar projetos em vendas.
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Quando tudo parecia correr bem, novo chefe, desta vez ganhando fácil do anterior na capacidade de humilhá-la e duvidar de sua competência, sobretudo quando havia plateia ao redor.
“Seu gerente vai vir?” “Você entende do que vamos falar?” “Não tem um engenheiro com você?” Perguntas assim, feitas por clientes em salas de reunião repletas de homens, completavam o circo de horrores enfrentado diariamente por Débora, mas não foram suficientes para fazê-la desistir.
A gravidade do caso chegou ao departamento de recursos humanos da empresa e o único resultado obtido foi a demissão da profissional, cerca de um ano depois, enquanto sua lenta fritura prosseguia no setor comercial, no qual a persistência da profissional em conseguir trabalhar acabariam lhe rendendo depressão e síndrome do pânico.
Virada
Mas o legado de 23 anos vividos dentro de um único grupo empresarial também lhe rendeu visibilidade no mercado e, mesmo sabendo dos problemas por ela enfrentados anteriormente, um outro nome dos mais expressivos do HVAC-R recentemente a contratou.
“O primeiro ponto a se levar em conta numa experiência como essa que eu vivi é jamais levar as coisas para o campo pessoal, erro que acabei cometendo e só me fez adoecer mais”, reconhece Débora.
“No fundo, o problema não é nosso, por sermos mulheres, mas sim da própria pessoa que nos assedia, cuja preocupação mesmo é o lugar que a gente possa um dia assumir na empresa”, acrescenta a executiva.
Caso se veja novamente envolvida em situação semelhante, ela se considera fortalecida, inclusive para não fazer com que o medo de perder o emprego a deixe tanto tempo calada, como ocorreu no antigo trabalho.
“Só aprendi com a dor o quanto é errado pensar que o mercado se restringe ao local onde você trabalha, é fundamental valorizarmos também a nossa história”, ensina.
A favor das mulheres e demais vítimas de segregação nas empresas, Débora destaca o forte debate existente em todo o mundo sobre diversidade e inclusão.
Esses assuntos, aliás, ela aborda sempre que possível com seu filho Lucas, de 11 anos, membro de uma geração que certamente terá pela frente a importante missão de consolidar os pequenos, mas promissores avanços ocorridos hoje nesse campo.
Antes disso, porém, os marmanjos já dão sinais de progresso. “Dia desses fui atender um cliente e, após conversar com uma verdadeira comitiva masculina, composta por umas dez pessoas, entre engenheiros, projetistas e empreiteiros de obra, ouvi deles: ‘Olha, quando você chegou, não dávamos nada por você, mas ficamos impressionados com a sua força de vontade, sem se preocupar se estava falando com homens ou mulheres’”, relata a profissional, nitidamente satisfeita com a situação acolhedora.