Imaginar que as camadas superiores da pirâmide social já possuem pelo menos um condicionador de ar em casa chegou a ser quase uma certeza no mercado.
No entanto, pesquisa recém-divulgada pela Associação Brasileira de Refrigeração, Ar Condicionado, Ventilação e Aquecimento mostra que as classes A, B1 e B2 correspondem a essa hipótese, respectivamente, em apenas 61,2%; 45,3% e 30,1% dos casos.
Considerando todas as faixas de consumidores, o índice impressiona ainda mais, pois não mais que 16,7% dos lares brasileiros têm enfrentado com um controle remoto nas mãos as cada vez mais constantes ondas de calor registradas de norte a sul do País.
Dentre os motivos para que isso ocorra, mesmo o ar-condicionado se tornando cada vez mais um item fundamental ao conforto e bem-estar das famílias, se encontra a falta de infraestrutura de instalação nos edifícios.
Prova flagrante disso está no fato de 23 milhões de unidades residenciais terem sido construídas no país em 12 anos, crescimento muito acima do registrado pela instalação de aparelhos e sistemas de climatização no mesmo período.
Copo meio cheio
Longe de provocar desânimo e decepção, os números da pesquisa elaborada pelo Departamento de Economia e Estatística da Abrava são uma oportunidade para que o AVAC-R prossiga seus investimentos para conquistar de vez o brasileiro, na avaliação do presidente executivo da entidade, Arnaldo Basile.
“As pessoas estão cada vez mais se interessando pelo uso do ar-condicionado. Elas se identificam com suas facilidades e benefícios como conforto, higiene, atenuação do ruído externo e melhora na qualidade do ar. Além disso, já compreendem que sistemas do gênero necessitam de manutenção e limpeza adequadas”, justifica o dirigente.
E embora o ar-condicionado residencial deixe de constituir, propriamente, um modelo de negócio, Basile ressalva que esse nicho é dinâmico e fornece oportunidades para quem busca emprego ou quer empreender na área, frente ao seu considerável potencial de gerar riquezas em todos os segmentos da economia brasileira.
O que precisa ser aprimorado neste mercado, segundo Arnaldo, ”e com bastante ênfase” – como faz questão de frisar – ”é a capacitação e treinamento de profissionais com um conhecimento formal adequado para executar os serviços de maneira correta e que atenda à demanda dos usuários. Este é o maior desafio a ser equacionado”, pondera.
”Podemos dizer que estamos em um estágio avançado nesta direção, mas ainda longe do ideal”, prossegue o executivo, aludindo à cultura já existente na área de capacitar seus profissionais, mas também – em contrapartida – ao grande caminho ainda a ser percorrido.
No caso da Abrava, ele cita como exemplos dessa diretriz parcerias iniciadas há décadas com instituições como SENAI, FATEC, FEI, Universidade de Uberlândia, Universidade de Brasília, Poli-USP e Instituto Mauá de Tecnologia.
Ainda segundo Basile, investir em formação continuada é tão levado a sério no AVAC-R que as próprias empresas fabricantes, assim como as especializadas em projeto, instalação e manutenção promovem frequentes atividades do gênero.
”Isso decorre do fato de nosso setor ser bastante diverso, com soluções destinadas a aplicações específicas, repletas de particularidades em vários momentos, do planejamento à execução”, analisa.
“Tamanha variedade requer dos profissionais cada vez mais tempo de estudo, até mesmo para que consigam acompanhar a velocidade do surgimento de novas tecnologias e técnicas”, acentua o presidente executivo da Abrava.
Gargalos
Dificuldades mesmo para o ar-condicionado brasileiro Basile identifica no poder aquisitivo do brasileiro e na idade avançada de boa parte do nosso parque imobiliário.
O primeiro aspecto ele exemplifica com os esforços das empresas distribuidoras e revendedoras em realizar promoções e financiamentos especiais para facilitar a aquisição dos diferentes aparelhos e sistemas.
”Isso tudo, porém, ainda esbarra na crença do brasileiro quanto ao alto gasto com energia, e ao desconhecimento até mesmo do valor médio das várias opções existentes no mercado”, constata.
Já o segundo fator limitante da área, mesmo diante da enorme demanda reprimida existente, Arnaldo qualifica como o mais preocupante.
”O maior problema, no meu entender, é que nos maiores centros urbanos do país ainda existe um grande número de edificações antigas, concebidas sem previsão de espaço até mesmo para os aparelhos de janela”, pontua.
Essa questão ele afirma se estender ao dimensionamento da rede elétrica, ”problemática que tem levado nossa entidade a conversar com a indústria da construção civil, por meio de diferentes comissões do segmento na Fiesp, em busca de soluções para viabilizar a adequação desses prédios”, assegura.
Compensações
Em contrapartida, Basile reitera ter bons motivos para considerar meio cheio o “copo” do setor, cujo ritmo de chegada até a borda depende de uma mistura o mais bem equilibrada possível de alguns ingredientes.
Um dos pontos positivos, por incrível que pareça, acabou surgindo em plena pandemia, ”pois a presença ameaçadora da COVID 19 nos ambientes acabou acelerando, de certa forma, o processo de as pessoas perceberem o ar-condicionado muito mais como parte da solução do que do problema”, afirma Arnaldo.
Ou seja, preconceitos relacionados a prejuízos à saúde pretensamente causados por ele passaram a dar lugar a um maior reconhecimento dos benefícios trazidos, uma vez bem instalado, operado e mantido.
Outro tabu que tem caído, segundo o dirigente, é o do consumo excessivo de energia elétrica, graças ao emprego de novas tecnologias, a exemplo dos fluidos refrigerantes que têm chegando ao mercado, e cujos benefícios se estendem ao campo da sustentabilidade.
As áreas da refrigeração comercial e industrial, por sua vez, Basile aponta como até mais delicadas, pois 99% dos sistemas funcionam de forma intensa e ininterrupta, o que os torna mais sensíveis diante de qualquer anomalia operacional.
“Quando a gente fala de descarbonização, eficiência energética, substituição, vazamento e flamabilidade de fluidos refrigerantes, por exemplo, tudo se torna especialmente crucial nessas instalações, que além de não poder parar, normalmente ocupam locais com grande movimentação de pessoas”, conclui o especialista.