As mulheres acabam de vencer mais um desafio histórico no mercado do frio, setor econômico tradicionalmente dominado por homens, sejam profissionais da indústria e de campo, executivos de empresas ou dirigentes de entidades patronais ou de empregados.
Esse mais novo marco tem como personagem a engenheira gaúcha Joana Bercht Canozzi, 36, que em 9 de junho tomou posse como diretora-adjunta de comunicação e marketing da Associação Brasileira de Refrigeração, Ar Condicionado, Ventilação e Aquecimento (Abrava).
Com isso, uma das mais influentes porta-vozes da equidade de gênero e da diversidade no setor se tornou a segunda mulher a fazer parte da diretoria da instituição em 60 anos de atividades.
Paralelamente, Joana continua atuando como vice-presidente do Comitê de Mulheres da Abrava, fórum setorial no qual são tratadas questões relacionadas à inserção e ao fortalecimento da presença feminina nos diversos segmentos do HVAC-R.
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O convite para participar da diretoria executiva “veio de forma muito surpreendente. Desde o início da minha carreira no setor, a atuação na Abrava me abriu muitas portas, e hoje percebo o quanto me envolvi nas iniciativas de forma natural. Iniciei no CB-55, participei da organização do Conbrava, dos departamentos nacionais, da Câmara Ambiental e, mais adiante, surgiu a oportunidade de contribuir para o Comitê de Mulheres”, conta.
A engenheira lembra que quando entrou pela primeira vez na sede da Abrava, se deparou com a parede onde fica a galeria de ex-presidentes da entidade ao longo dos anos.
“Vi o rosto de diversos senhores reconhecidos por sua atuação no setor e me perguntei, silenciosamente, se algum dia eu viria uma mulher juntamente àqueles senhores. Naquele momento, eu não pensava, de modo algum, em ser diretora”, comenta.
O ano de 2022 tem sido emblemático para Joana também na administração de sua vida profissional. Após atuar por pouco mais de quatro anos na Chemours do Brasil, onde ocupou o cargo de líder de desenvolvimento de negócios da área de soluções térmicas e especializadas, ela foi contratada, no começo deste ano, pela Emerson, onde é diretora de serviços de engenharia da empresa na América do Sul.
Trajetória meteórica
Nascida em 1985, em Porto Alegre (RS), Joana graduou-se em 2010 em engenharia de alimentos pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), onde também concluiu, em 2013, seu mestrado em engenharia química.
Ainda em 2009, antes de se formar na faculdade, iniciou a carreira estagiando na unidade da Ambev, em Lages (SC). Mesmo assim e mostrando personalidade forte, decidiu sair da companhia de bebidas por não se identificar com a empresa.
Em 2012, pouco antes de finalizar seu mestrado, foi selecionada para passar um período de um ano no programa de trainee da Linde Gases, considerada uma das maiores empresas químicas do mundo. Efetivada, atuou até meados de 2016 como engenheira de aplicação de gases industriais e no desenvolvimento de mercado e suporte técnico a clientes de diferentes setores.
“Foi na Linde Gases que tive contato, pela primeira vez, com demandas da área de refrigeração, apesar de a empresa não atuar diretamente no setor no Brasil, mas em outros países ela tem presença significativa na distribuição de fluidos refrigerantes, e assim tive a oportunidade de desenvolver algumas aplicações com fabricantes importantes de equipamentos”, afirma.
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Foi somente em 2017, porém, após uma passagem muito curta pela Coats Corrente, onde exerceu o cargo de executiva de vendas por um ano, que Joana ingressou efetivamente no mercado de refrigeração e ar condicionado, quando aceitou o desafio de ser coordenadora técnica na Chemours.
“Comecei na Chemours porque buscava uma oportunidade de trabalho na área técnica em uma empresa química, e isso me abriu portas para mergulhar no mundo da refrigeração, onde simplesmente me encontrei como profissional”, enfatiza.
Ao olhar para trás, Joana entende que um dos momentos mais marcantes e desafiadores em seu desenvolvimento técnico foi a realização do primeiro retrofit, época em que aprendeu muito e superou vários obstáculos profissionais.
Segundo ela, outros momentos muito marcantes em sua trajetória foram a primeira e a segunda edições, em 2018 e 2020, do “Agora é que são elas – Mulheres no AVAC-R”, evento promovido conjuntamente entre o Sindicato das Indústrias de Refrigeração, Aquecimento e Tratamento de Ar no Estado de São Paulo (Sindratar-SP) e a seção brasileira da Associação Americana de Engenheiros de Aquecimento, Refrigeração e Ar Condicionado (Ashrae Brasil).
“Fiquei surpresa ao encontrar tantas mulheres atuando no mercado de refrigeração, pois ao longo da minha trajetória na área técnica tive muito pouca interação com outras profissionais”, descreve a executiva, comentando que a Febrava 2019 também foi outro momento marcante, pois “percebi o significado e o valor do meu trabalho para o setor e vi a consolidação do movimento de mulheres dentro do HVAC-R”.
Desafios
Movida por grandes desafios, Joana revela que participar de projetos importantes com clientes estratégicos e gerar resultados positivos para ambos é algo que ela considera a maior conquista do seu trabalho.
“Receber o reconhecimento de um cliente é algo que não tem preço, é definitivamente o que busco na minha carreira e o que encontrei diversas vezes no setor”, resume.
Da mesma forma, compor o Comitê de Mulheres de Abrava também se materializou em um importante marco para a engenheira gaúcha, visto que amplificou o alcance dos holofotes para a participação das mulheres no setor.
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“Isso é reflexo de que a união pode nos levar mais longe, mas tudo deve ser feito com profissionalismo e seriedade. Precisamos nos desenvolver e buscar aperfeiçoamento sempre, porque só assim estaremos aptas a embarcar de maneira confiante nas oportunidades que nos forem apresentadas”, salienta.
Sobre o fato de agora compor a diretoria da Abrava, ela entende que “esse é um grande passo para as mulheres, pois abrimos juntas uma porta que vai nos levar a outro patamar. Espero que todo esse trabalho seja inspirador não somente para mulheres, mas para todos os que apoiam a diversidade”, complementa.
Além da transição na carreira, Joana também tem se dedicado intensamente à filha, que neste ano comemorou seu primeiro ano de vida.
“A maternidade mudou a minha vida e me motivou a assumir todos esses novos desafios da carreira; a partir disso, sigo aprendendo muito e busco inspirar outras pessoas na mesma direção”, conclui.
ERRATA – A versão inicial desta reportagem informava, erroneamente, que Joana Canozzi era a primeira mulher a assumir um cargo na diretoria executiva na Abrava. Na realidade, ela é a segunda. De acordo com a entidade, a engenheira Juliana Pereira atuou em sua vice-diretoria na gestão 2016-19.